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George Cassiel

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... soltam-se as palavras...




Monday, June 27, 2005


(...de Paulo José Miranda)
PLANO DE SENTIDO


Plano de sentido. Uma dualidade do que quer ser dito que a própria gramática (lógica da linguagem) não só permite como exige. Estamos diante de uma dualidade do genitivo: subjectivo e objectivo. E apropriar-se de um ou de outro no momento de compreender a proposição em causa é opor um ao outro naquilo que pode ser o que está a ser dito. Tomemos o que «plano de sentido» diz através da sua função de genitivo subjectivo: «plano» aqui diz projecto, desenho, planta, artimanha, pode até dizer vida, já que é aquilo que alguém realiza previamente enquanto sentido; é uma intenção de vida. «Plano de vida» diz, aqui, a orientação que previamente alguém dá (traça, desenha) às coisas (para as): mas é, também, como se remetesse para uma anterioridade, um «este é o meu». «Plano» é substantivo, obviamente, aquilo que atribui substância ao «sentido», à direcção. Tomemos agora o que «plano de sentido» diz na sua função de genitivo objectivo: «plano» diz ausência de desigualdade de níveis, raso, liso, sem qualquer possibilidade de referência; é uma descrição, que pode ainda apresentar no seu interior uma duplicidade de querer dizer, enquanto facto e enquanto sentimento. Enquanto facto, a descrição «plano de sentido» diz ausência de referência para o sentido, o sentido encontra-se no chão, aquilo que se quer dizer não se ergue: é como se remetesse para um «isso é» anterior. Enquanto sentimento, a descrição «plano de sentido» diz ausência de referência para a vida, a vida, aquilo que dela se esperou encontra-se no chão, as expectativas não se erguem, não há no horizonte nenhum sinal que referencie uma alteração a esta secura de vida, a este deserto existencial: é como se remetesse para um «eu estou (sou)» anterior. «Plano» é adjectivo, obviamente, aquilo que determina (qualifica) o substantivo «sentido».
Por conseguinte, a proposição «plano de sentido» exige uma explicação, uma anterioridade. É um alguém a falar de uma coisa, de uma proposição, ou é um alguém a falar de si próprio. A gramática sem esta referência é um jogo onde abundam os batoteiros, os malfeitores, aqueles que se aproveitam da momentânea fragilidade da gramática. A fragilidade da gramática é não ter a quem servir («plano de sentido», só por si, sem nenhuma anterioridade, permite quase tudo, o que para alguém sem escrúpulos é uma festa). Abusar da gramática é coisa de malfeitores, coisa de poetas, que destroem o mundo em benefício de si próprios.
Para além da lógica há tudo e nada, não se pode dizer. Mas que diz um poema? Nada, mostra. Do mesmo modo que a forma lógica. Assim, nos antípodas da linguagem, o servilismo da gramática e a sua pilhagem, estamos face a uma mesma dificuldade: compreender porque se vê, compreender como é que é possível ver, compreender como é que aquilo que se vê não cega, compreender como é que é possível estar a ver aquilo que se não pode dizer. Na gramática (e na vida), polícias e malfeitores são incompreensões no mesmo estado.

® Paulo José Miranda


Cassiel @ 10:24 AM

1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Excelente texto.
Parabéns ao George Cassiel por este novo projecto.

5:10 PM  

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